Meu cantinho

Criei um cantinho para postar os meus primeiros vôos, na inebriante tarefa que é escrever. Aqui tem os meus pensamentos, as minhas revoltas, e tudo o que vai pelo peito de uma mulher que é uma eterna apaixonada.
Coisas de mulher com alma sonhadora.
Mas sem pretensão de ser escritora.
Beijos e beijos

Tania

domingo, 11 de abril de 2010

Voltar para Aracaju...


Era época de Natal, eu uma adolescente obrigada as viagens de fim de ano com a família, e o frio gela meus pés, estou cheia de saudades, as lembranças de Aracaju o lugar onde eu posso ver um céu azul chegam e aquecem meu peito. Estou longe do meu sol, de suor escorrendo no rosto, de ruas sem asfalto, do meu rio correndo com golfinhos se exibindo. Aqui eu não tenho nada disso, eu quero voltar...
O que me importa se aqui é minha terra, minha casa, cheia de conceitos e preconceitos, aqui eu não vejo Zé Peixe como um peixe vencendo as águas com um saco de plástico na cintura onde guarda o dinheiro que recebeu. Aqui é muito frio, e tem muito prédio grande. Eu nem posso sair sozinha; fingir que vou à igreja ver Pe Claudionor, e ficar nas escadas do fundo da igreja, ensaiando um namoro cheio de conversa e paixão, onde só se pegava na mão, e roubava-se um rápido beijo na despedida.
Todos os dias quando a sineta do japonês toca, para vender frutas, fico pensando no meu Cavaco Chinês, nos “sonhos” quentinhos da padaria, no final da tarde, lógico depois de comer o cachorro-quente de Seu João lá no parque, e de muito brincar de mocinho e bandido, com Pascoal, Ceiça Lisboa, João Carlos, Liz e Max, e o chato do Tadeu que devia ficar com Angélica, no balanço afinal Popo já amarrou as cordas na árvore e eles são pequenos ainda, mas querem entrar na brincadeira, lá na cascatinha, um prédio abandonado?! Não, acho que uma montanha de pedra com entradas e saídas que nos servia de diversão.
Eu amo todos aqui, mas já é hora de voltar. No próximo Natal eu volto um pouquinho, mas agora já vai ser Festa de Reis, e eu quero ir para Itabaianinha. Eta! A turma está toda lá esperando, Jurinha, Ângela, Leda, e eu vou comer doce de carambola, na casa da Vó de Tensinho e Leda. Hum! Só quem já provou sabe como é bom. E o melhor, quando voltarmos de Itabaianinha, Seu Tobias ainda não desarmou o carrossel.
Vamos embora, já é tempo de voltar... Eu juro que vou prá banca de D. Virginia, sem reclamar, aquela chatura onde só se aproveita a presença de Inácio, o irmão dela que está lá pintando e nos fazendo rir, isso até Padre Pedro chegar resmungando.
Eu estou com tantas saudades. Quando eu chegar na banca não vou inventar brigas com Max e Luizinho Santana, eles pensam que são autoridades, só porque o pai é dono de cartório, eu conheço Barreto Mota que é famoso e nem me gabo; e tem ainda o purgante irmão de Agláe Fontes, uma mulher que eu não sei nem quem é,só sei que é amiga de meu pai, mas ele acha que é gente muito importante...
Eu sei que aqui é a casa de meu Avô e estou em casa. Ela é grande, tem um pé de coqueiro que papai plantou, tem conforto, mas eu prefiro ficar brincando de queimado, pinta galo, e macacão lá no Instituto Histórico. Não precisam ficar preocupados! Eu vou brincar mais com as meninas do que com os meninos, já marquei com Lú e Nete, filhas de seu Araujo da Cinelândia, Elaine e Ealine que são filhas de Zenilde, tem também Angela e Leda Teixeira, que são filhas de seu Hermes aquele que tem a padaria na frente dos correios, nenhuma delas vai levar irmão. Eu acho... Mesmo porque vale à pena, depois do queimado D. Luzia a mãe de Lu, sempre nos dá um belo sorvete, o meu sempre de mangaba. Aqui tem sorvete de Mangaba?
Já estou enjoada de Maçã, Uva, Pêra, eu quero é ir para a feira lá no mercado com papai, tomar caldo de cana, ficar com a boca roxa de mangelão, me entupir de jabuticaba, sentir o cheiro da comida daqueles restaurantes no meio da feira, comprar garrafinhas do refrigerante Hulli Guli, para levar para casa, cavalos e jarro de barro lá no fim do mercado, e de quebra ficar dando risada das poses de defuntos dos retratos do lambe-lambe.
Em Aracaju no domingo, com certeza vou a praia, lá tem um mar de águas quentes bem salgadas, e depois um banho de água doce. Tudo isso no sítio de Robério Garcia,e D. Sinole, amigos de meu pai, e meu amigo apesar da diferença de idades. Ele me conta umas coisas de um país distante, muito empolgado que sei que um dia eu vou entender. São sonhos bonitos, mas falar nessas coisas, me disse papai, é perigoso.
Então, já passou o Natal, eu já fui ver toda a família, um monte de tios, avô, avó, até uma bisa. Se não andarmos rápido, não veremos a procissão de Bom Jesus no Rio Sergipe, no dia 1º do ano. Eu nem gosto muito, ficamos em pé, o sapato dói, a meia esquenta o pé, um vestido rodado que pinica o tempo todo na cintura, e as eternas recomendações “Tenha educação” mas vou com todo prazer.
Tenho certeza de que quando chegarmos, poderei andar descalça no Parque, e no caminho, andando pela Rua de Stº Amaro, falarei com Sr Nelson na Padaria, Sr Constancio Vieira e Dona Costinha sempre sentados na porta, aquele político grandão, com nome de Paixão, e um monte de pessoas que me dão saudades. Terei que ir ao BB, com atenção e cuidado, levar papéis e dinheiro, a tal encomenda, e entregar a Raimundo Luiz, que me devolvera um monte de papéis. E a mesma encomenda no Dantas Freire, onde tem um senhor cheiroso, arrumado, com nome de Murilo. Mas na volta, eu posso ver as novidades da Dernier Cry, embora não tenha dinheiro pra comprar nada. Dou um alô ao Seu João Hora na Moda, entro nas Lojas Brasileiras, vejo na porta da Safira Sr. Vavá e aquele homem feio que pinta a sobrancelhas, e diz que é dono de tudo, grande coisa... E dou uma olhada nas promoções da Casa da Louça, pra contar em casa.
Eu nunca me atraso fazendo os mandados, quando chego Tio Toto e Tia Dira, sempre de bom humor, ainda estão na Bodega de Araujo,que fica na esquina da Laranjeiras com Stº Amaro. Minha mãe ainda não acabou de ler o jornal do dia e a Coluna de Tereza Neuma, e não precisa ligar o radio,só depois da janta (odeio), onde todos comem juntos, e vão ouvir Reinaldo Moura, na Radio Cultura, em “Uma crônica para Você” escrita por Wellington Elias, sempre sobre aniversários de pessoas que nem conheço.Aqui nessa hora, tem sempre uma visita chegando falando muito e lamentando das saudades, ou saindo com sugestões para ficarmos de vez nessa geladeira...
Eles nunca vão me entender... Eu quero o mingau de puba de minha vó, e não aquele saco daquela polenta. Aqui é tudo tão estranho, todo mundo branco, uns loiros, outros de olhos puxados, alguns fazem questão de falar entre os seus em outra língua para não serem entendidos. Pobre do meu amigo Sergio Garcia Moreno, tão moreninho, apesar de ser filho de um velho médico, seria olhado como um estranho no mundo, pouco importa que ele mora ali no parque, e é vizinho de Dr. Lélio Fortes, o meu bendito dentista.
Eu preciso de minha Aracaju, onde todos me conhecem, eu ando a pé, tudo é perto. Não existe aquele monte de prédio escondendo o céu.
Eu sei que aqui sou estrangeira, mas é aqui que quero fincar minhas raízes. O meu Paraná está cada vez mais longe e estranho.

Tania